quarta-feira, 31 de março de 2010

Numa Poesia Cabem....






Numa poesia cabem:


O fermento da fantasia,
que faz crescer as estrofes.

Um par de asas,
para os vôos da imaginação.

Uma lágrima de melancolia,
que no verbo busca seu ombro.

A voz da chuva...
Para cantar as rimas.

O carro da filosofia,
que conduz a idéia.

Uma mão de tinta do arco-íris,
para pintar as metáforas.

Uma gota de inspiração,
vitamina para escrever.

O sorriso de uma criança...
Porque estão parindo um verso.

O baú de um venerável ancião.
Biblioteca que cimenta a arte.

A fotografia de um momento,
que no poema se revela.

O sopro de uma vida,
para oxigenar as palavras.

Um beijo de amor...
Tônico para o coração do poema.

Um lenço molhado de adeus,
para a tinta da emoção não secar.

O olho aberto da insônia...
Porque a noite é boa para escrever.

E ao poeta cabe:
Colorir a face lívida
de uma página em branco.

Rosemarie Schossig Torres

A Eternidade De Um Minuto

A magia de um encontro.
Poesia tecida
pelas mãos do acaso.
Ou quem sabe... Do destino.

É a pulsação de eternidade,
que a cada instante,
entra por uma janela,
ou dobra uma esquina...

Como se o tempo,
em um momento de distração,
perdesse o controle,
afrouxando as rédeas...

E duas almas gêmeas,
durante um segundo,
se abraçam; voam ao céu
dos desejos atendidos...

Nesse instante, o paraíso existe.
O homem toca o infinito
e se encontra ,frente a frente,
com a eternidade de um minuto.

Rosemarie Schossig Torres

quinta-feira, 25 de março de 2010

Olhos De Menina


Empreste-me teus olhos menina!
Para que eu veja o mundo,
com as quimeras que sonhei ontem.
Traga de volta meu barco...
Aquele das ilusões perdidas.

Então, por um instante,
voarei ao passado.
Leve, como asas de libélula,
quase sem bagagem,
viajarei solta no ar...

E despida do caminho áspero,
das malas de recordações,
deixarei os fracassos enterrados
no fundo do espelho...

Ajude-me pequena!
A descalçar as botas de chumbo,
que me prendem a este deserto...
Só necessito de um minuto de ti,
para depois, poder voltar.

Quero penetrar em teu horizonte...
Renovar o oxigênio
de meus moinhos de vento.
Velhos tesouros perdidos.

Pudera retornar ao mesmo céu
de minhas vésperas...
Que falta faz aquela estrela!
Caiu no mar como um cometa,
levando todos os sonhos,
que hoje são náufragos...

Rosemarie Schossig Torres

Penélope Quase Andrajosa

Sombras! Minha alma ficou no escuro
e percorri nas trevas um bom pedaço.
Cheguei ao lugar onde acaba o futuro.
Vi a caveira do porvir; face do fracasso.

Já não havia saída. Só um muro.
Transborda do meu copo o cansaço.
Sua gota de água e sal: líquido puro,
lava a face e a dor afrouxa seu laço.

Por pouco a tempestade vence o jogo!
Pequena esperança acende seu fogo.
Um tempo amigo agora sopra a favor.

Penélope quase andrajosa. Juntei os trapos.
Os fios refaço, já costuro meus farrapos.
Ainda erma e combalida, recupero a cor.

Rosemarie Schossig Torres

terça-feira, 23 de março de 2010

Esqueletos No Armário






O que faço com esse ossuário?
Amontoado de esqueletos velhos.
Espiam-me de dentro do armário.
Fantasmas do além dos espelhos.

Na poeira que o chão arquivou:
pedaços de delírios esclerosados;
devaneios que a pele aposentou;
simulacro dos prazeres passados.

Acumulação de entulhos, escarcéu.
Lembranças largadas no necrotério.
Revelações do ego repetidas ao léu.
A esmo vagueio por esse cemitério.

Como alivio o peso dos ombros?
Restos de mim, já tão danificados.
Somente uma pilha de escombros.
Vivo algemada a tesouros mofados.

Oxidam as idéias; limiar da sucata.
Ainda há pontos de luz na sombra.
Mas a reciclagem é tarefa inexata.
O desejo de ser fênix me assombra.

Rosemarie Schossig Torres

terça-feira, 16 de março de 2010

Teimosa Chuva


Teimosa chuva. Por que não paras?
O sangue coagula. Oxidadas veias.
E o meu pobre coração mofado,
bate fora do tom. Descompassado.
Todo o alento sucumbe às cheias.
Inspiração afogada; me desamparas.

O dilúvio cresce, choram as vidraças.
O céu se cobre com uma capa gris.
Gota a gota as idéias são levadas.
Perdem-se no ímpeto das enxurradas.
Então, o meu verso emerge infeliz.
Asas molhadas; passarinho sem graça.

Palavras ensopadas; sem paradeiro,
escorem pelos dedos. Tormento.
Nada do que escrevo permanece.
A musa em umidade se desvanece.
Então pergunto ao firmamento:
Porque não pára este aguaceiro?

Rosemarie Schossig Torres

Árvore Seca





Não jogue em mim
essas folhas amarelas,
cãs, outono de teu jardim.
Nem me arrogues deslizes
de reviver as mazelas;
ser estigma: cicatrizes.


Eu não sou tuas lástimas!
Muito menos raiz de dissabor…


Quero deixar o banco dos réus.
Declino esse peso em meu costado;
carregue sozinho teus mausoléus.
Serei morte, doença, as recaídas?
Não quero meu nome imortalizado
em dedicatórias de cartas suicidas.


Não chore minhas lágrimas!
Nem sofra com minha dor...


Nunca serei uma árvore seca plantada
no meio de teu caminho.
Quando a última trincheira tenha tocado
e chegue à folha conclusiva de meu destino...
Não faças de refém a minha história. Deixe-me ir...
Na viagem que encerra qualquer enredo: partir.


Rosemarie Schossig Torres

Achados E Perdidos


Perdeste algum sentimento?
Busca no piso da tua alma,
ao rés do chão...
Entre as pequenas sensações,
que semeias e colhes
todos os dias...

Perdeste um momento?
Procura num vértice do tempo,
ali onde o vento faz a curva.
Quem sabe não caiu por aí...

Perdeste um verso?
Talvez esteja nas entrelinhas
dos pensamentos que nadam
no mar da sua mente.

Quem sabe não se afogou...
Naquele momento perdido,
quando perseguias aquela emoção
que já não é mais...

Rosemarie Schossig Torres