terça-feira, 23 de novembro de 2010

Aquela Gota Primeira...



Pega a gota de ânimo que resta
e faça uma festa; sai a passeio.
Entre as ânsias abre uma fresta.
Vamos! Avança; tira o pé do freio.

Absorve o azul desse céu infindo
e rasga o véu dos olhos, respira!
Depois diz com a alma: Dia lindo.
Aí, coração, com calma, suspira.

Então a paz recebida, espalha...
Deixa fluir vida em ti, alvissareira.
Esse sentimento bom esmigalha
e multiplica aquela gota primeira.

Rosemarie Schossig Torres

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Não O Fim, Mas Sim, A Senda




Eu já nem sei bem se é o poema,
arteiro ,que pelo avesso me vira .
Ou se o meu corpo inteiro respira
em verso, onde exalam os dilemas.

Na trilha desse dizer-me resvalo.
Tudo que de mim mesma oculto,
lá no jardim do âmago, inculto,
súbito , em rimas, eu despetalo.

Alheias, cismam janelas abertas.
No improviso, ao reverso, cenário
é que adentra o verso, contrário
esteio ; novas palavras desperta...

Enquanto o verbo me desvenda....
Eu, envolta em rendas alegóricas;
entrelinhas veladas, metafóricas,
busco não o fim; mas sim, a senda.

Rosemarie Schossig Torres

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Acaso Ou Destino



Dois caminhos diferentes,
como paralelas avenidas.
Dois destinos tangentes,
cruzados no meio da vida.

São dois olhares casados
na luz de uma mesma sina.
Dois momentos enlaçados
ao se toparem numa esquina...

São como palavras que rimam
numa estrofe, fazendo a poesia.
Ou sons em diapasão que afinam
para comporem, juntos, melodia.

Mas quem sabe não existe o destino?
Talvez seja apenas broma, diabrura
do acaso. Toma a forma de menino
e arquiteta, ladino, a sua travessura.

Rosemarie Schossig Torres

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Poema Bisonho




Nas entrelinhas das horas banais,
crepitam os momentos perdidos.
Gritam à espera de serem ouvidos.
Mas só tocam trilhas incidentais.

É música anã e quase inaudível;
sons que se movem em segredo.
Às vezes pareço tirar do degredo
a partitura em surdina; invisível.

Tento mudar esse anônimo canto.
E o corriqueiro; quero a harmonia;
poetizar a poeira, versificar agonias
e virar o disco que eu já ouvi tanto.

Assim escrevo esse poema bisonho.
Para que raie sol menor; desacorde.
Enfim, que consiga afinar os acordes,
e sigam de acordo com meu sonho...

Rosemarie Schossig Torres

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Por Um Fio



Triste lamento vagava sem sossego.
Emprestou-lhe as suas asas o vento.
Voz solitária buscava um aconchego
ou ressonância; eco ao seu desalento.

Indo pelas ruas esse cicio, depositário
da fé por um fio, pelas igrejas vogava.
Tentou entre turíbulos e escapulários
se aninhar, mas a pompa o assustava.

O fausto do templo seu clamor abafou.
Voltou às calçadas e de porta em porta
esse cochicho infatigável , perambulou.
Nada achou; a esperança quase morta.

Feito flor ninada pela brisa indolente,
foi carregada; voz vazia, quase derruiu,
mas por fim aterrissou no riso inocente
de uma criança. Afagada então, dormiu.

Rosemarie Schossig Torres