sábado, 26 de novembro de 2011

O Poço Do Pretérito





Não é só o pescoço que dói ao olhar prá trás...
E como lastimam as saudades dos anos moços!
Tudo culpa da memória, esse fantasma contumaz.
Plasma idas trajetórias; deixa a alma em alvoroço.

Vou caindo no poço do pretérito sempre imperfeito.
Ressuscitam as feridas, antes de serem cicatrizes.
Desfilam maus e bons slides ; videotape mal feito.
Então ardemos olhos agora tristes, depois felizes.

Um decrépito moinho, que de repente desenferruja.
Vale outra vez aquilo que durante anos não se sente.
Sensações projetadas na tela do retrovisor, garatujas
mal traçadas no rosto de um assombrado presente.

Rei posto; tempo passado, faz uma sombra enorme,
que às vezes desata a rir, mas outras leva às lágrimas.
Escombros de histórias inexatas em flashes disformes.
As cinzas revivem, então revejo as glórias e as lástimas.

Chip nostálgico, é um copião do texto pela vida redigido.
Encaro essa flor antropofágica comendo o que me restou,
corroendo o meu futuro; está cada vez menor... Encolhido.
Dói a nuca, mas isso é fatal, pois a melhor parte já passou.

Rosemarie Schossig Torres

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

À Verdade Sem Subterfugio









                                                         
Uma brisa estranha entra na janela interior.
Vem e espalha por meu pequeno universo
tudo o que colheu além, pelo léu, disperso.
Um cicio, vozes, o aroma de misteriosa flor.

E folha a folha abre o meu livro esse vento.
Nascem centos de finas páginas, ilegíveis,
linhas táteis; aí vou tocar pontos sensíveis.
Emoções de gás que brotam de momentos.

Mínimas porções... Filamentos que sentem!
Um vaivém de novas sensações, sementes,
dos futuros gestos, amores; a ânima silente.
Luas manifestas em meu jardim se refletem.

... Chegam aqui neste lugar, o último refúgio,
aonde finda todo o corpo e principia a alma.
Meu derradeiro limite entre o dentro e o fora.
Aqui me entrego, à verdade sem subterfúgio.

Rosemarie Schossig Torres

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

FLOR NUA



Algo diferente paira no ar; em mutação.
E num strip-tease perco partes minhas.
Mas não me preocupa essa denudação.
Só me desocupo daquilo que definha...

... que sem pena despejo; descartável.
E meu desejo estancado por tantos nós!
Preciso desatar! Trilha; via intransitável.
Estou encolhida de frio e coberta de pó.

Flor nua; encerrada com seus invernos...
Sou rosa, que caídas as pétalas, aguarda,
em traje de sombras; não vivo...Hiberno,
à espera que o gelo derreta; o fogo arda.

Sei: Peças de mim não verão a primavera.
Não me peçam para arcar com isso tudo;
arquear com meu refugo; a alma pondera:
Eu devo cortar o jugo inútil; não me iludo.

Rosemarie Schossig Torres